segunda-feira, 12 de maio de 2008





Eno


"Eno, um jovem rapaz educado na pobreza e na indigência, ganhava a sua subsistência e a de sua mãe vendendo madeira no mercado. Nunca havia tido a oportunidade de aprender a ler e a escrever.

Um dia, quando levava lenha a um cliente, a sua atenção foi desperta por um homem que recitava um sutra. A partir do momento em que escutou palavras desse sutra, o Sutra do Diamante, o seu espírito sofreu uma transformação e ele despertou.

Decidiu então tornar-se monje. Estabeleceu-se no templo de Konin. Mas, enquanto jovem discípulo, iniciante e completamente iletrado, não podendo receber a ordenação de monje, manteve-se simplesmente assistente de cozinheiro.

No templo do mestre Konin o poema escrito por Jinshu era considerado como o melhor :


O nosso corpo é como a árvore de Bodhi.

O espírito é como o espelho precioso.

Também devemos nós a cada dia desempoeirá-lo

A fim de que a poeira nele se não deposite.


Se a cada dia praticamos , acaba-se por obter o satori. Passo a passo, é o Zen gradual tal como o concebia Jinshu.

Eno olhou o poema e pediu a um dos seus amigos que lho lesse.

«Oh, é um grande poema! Jinshu tornar-se-à certamente o sucessor de nosso mestre», disse o amigo, e leu este poema a Eno.

«É um erro, insurgiu-se Eno. Não é o verdadeiro Zen. Jamais o nosso mestre ensinou tais coisas. Escutei as suas conferências, e não encontro neste poema a essência do seu ensinamento. Escreve-me isto, por favor:


Não há árvore de Bodhi

Nem espelho precioso

Tudo é vacuidade (ku)

Aonde a poeira poderá depositar-se?»


Eis o Zen súbito. Zazen, ele próprio, é satori, aqui e agora. Estes dois pontos de vista, apesar da sua contradição, podem parecer exactos. No entanto, é a Eno que o mestre remete a transmissão. «Tu deves fugir, os meus discípulos irão procurar matar-te. Compreendeste o Zen. Obtiveste o satori.»
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Le Trésor du Zen, Albin Michel.
S/título, téc.mista s/tela, 80x116cm, 1999.
Obra destruída.
Pintura de Luís de Barreiros Tavares.
Trad.:L.B.T.


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